quinta-feira, 26 de julho de 2012

George Orwell - 1984

Foto: Maiara Alves
1984
ISBN: 9788535914849
Autor: George Orwell
Tradução: Alexandre Hubner e Heloisa Jahn
Editora (Br): Companhia das Letras
Páginas: 414
Gênero: Literatura Estrangeira/Romance

Sobre: 1984 é uma das obras mais influentes do século XX, um inquestionável clássico moderno. Publicado em 1949, quando o ano de 1984 pertencia a um futuro relativamente distante, tem como herói o angustiado Winston Smith, refém de um mundo feito de opressão absoluta. Em Oceânia, ter uma mente livre é considerado crime gravíssimo, pois o Grande Irmão (Big Brother), líder simbólico do Partido que controla a tudo e todos, "está de olho em você." No íntimo, porém, Winston se rebela contra a sociedade totalitária na qual vive: em seu anseio por verdade e liberdade, ele arrisca a vida ao se envolver amorosamente com uma colega de trabalho, Júlia, e com uma organização revolucionária secreta.

Opinião: Foi um dos livros mais incríveis que já li até hoje e sabia que me marcaria mesmo antes de lê-lo. Por ser publicado originalmente em 1949, 1984, do britânico Eric Arthur Blair (nome original de Orwell), parecia um futuro distante, ficção de fato. Mas poucos livros retrataram tão bem e tão fidedignamente a nossa sociedade. 1984 é os anos 1920, 1930, 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1990, 2000 e, infelizmente, ainda, os anos 2010 no sentido político-ideológico. Orwell pensou, especificamente, o pós-guerra e o início da Guerra Fria, ainda não cheguei lá (acabei de sair da Idade Média), mas no geral podemos dizer que o livro retrata todo o século XX e início do XXI (ou não).

A década de 1940 foi um momento de grande turbulência na Europa, África e América - na Ásia também, é claro - e para expressar, com todas as limitações em que os grandes pensadores são submetidos, George Orwell criou um mundo para ilustrar esse mundo de conflitos bélicos, políticos e ideológicos que vivenciou. Como disse, ainda não cheguei em Contemporânea, muito menos Hist. do Tempo Presente, por isso não posso comentar com propriedade sobre o que Orwell ou Goldstein escreveu sobre a I e II Guerras Mundiais e todos os outros eventos que as antecederam e sucederam, mas pelo meu limitadíssimo conhecimento deu pra perceber alguns pontos interessantes.

O livro é dividido em três partes. Na primeira, Winston nos é apresentado e é encarregado de mostrar ao leitor como o mundo funciona em 1984; na Segunda Parte Winston, à seu modo, se rebela contra o Partido (a instituição governamental de 1984) e, não obstante, conhecemos Julia que há tempos, também à seu modo, se rebelava contra o Partido (ou achava que o fazia). E na Terceira Parte é repreendido é moldado ideologicamente aos interesses do Partido. Entre outras coisas, Orwell critica o positivismo no que concerne a negação e reconstrução do passado. Fala também da manipulação de fontes, quando em 1984 a história é constantemente reescrita de acordo com os interesses do Partido (assim como o ensino de História). Orwell também utiliza o conceito de classe, mostrando sua influência marxista comum aos grandes pensadores até a primeira metade do século XX. Outro ponto interessantíssimo é a Novafala que, genialmente, Orwell percebeu que começava a ocorrer no século XX, pois é notável que a cada ano usamos menos adjetivos e destituímos a gramática e a cada ano as gírias e abreviações (principalmente na internet) contribuem para limitar nossa capacidade de raciocínio... mas quando eu falo em alguma teoria da conspiração sou taxada de doida, pois é.

Na Segunda Parte destaco o livro de Goldstein, no qual tem o mesmo papel que o próprio 1984 possui na nossa sociedade: o de mostrar como as coisas "realmente funcionam", na verdade foi um choque saber que o livro foi escrito pelos próprios integrantes do Partido (ou não, O'Brien pode ter dito isso pra confundir Winston, vai saber, até o leitor fica confuso hehe). As passagens mais interessantes estão na Terceira Parte, nos diálogos entre Winston e O'Brien e, principalmente quando Winston, após semanas/meses de tortura vê seu reflexo no espelho. Daqui a um ano ou dois, após estudar Contemporânea/Tempo Presente, notarei pontos mais relevantes do objetivo de Orwell com o livro. Por ora, é recomendável por retratar a nossa sociedade tal como ela é no sentido político/ideológico: não que o leitor tenha de escolher entre os dois blocos econômicos dominantes que começavam a se delinear no período em que o livro foi escrito e publicado, não.

 O leitor deve observar como somos constantemente manipulados, em como a Memória coletiva e individual é manipulada, em como a História é constantemente reescrita e como as fontes, como disse Le Goff em História e Memória, não são ingênuas atendendo assim aos interesses políticos vigentes.


Quotes
Goldstein bradava seu discurso envenenado de sempre sobre as doutrinas do Partido - um discurso tão exagerado e perverso que não servia nem para enganar uma criança, e ao mesmo tempo suficientemente plausível para fazer com que o ouvinte fosse tomado pela sensação alarmada de que outras pessoas menos equilibradas do que ele próprio poderiam ser iludidas pelo que estava sendo afirmado. (p. 23)
Ninguém ouvia o que o Grande Irmão estava dizendo. Eram apenas algumas palavras de estímulo, o tipo de palavras pronunciadas no fragor da batalha, impossíveis de distinguir isoladamente, mas que restauram a confiança pelo mero fato de serem ditas. (p. 26)
Era um desses sonhos que, mesmo mantendo o cenário onírico característico, são uma continuação da vida intelectual da pessoa, e em que tomamos consciência de fatos e idéias que continuamos achando novos e valiosos depois que acordamos. (p. 42)
Se o Partido era capaz de meter a mão no passado e afirmar que esta ou aquela ocorrência jamais acontecera - sem dúvida isso era mais aterrorizante do que a mera tortura ou a morte. (p. 47)
E se todos os outros aceitassem a mentira imposta pelo Partido - se todos os registros contassem a mesma história -, a mentira tornava-se história e virava verdade. "Quem controla o passado controla o futuro; quem controla o presente controla o passado", rezava o lema do Partido. E com tudo isso o passado, mesmo com sua natureza alterável, jamais fora alterado. Tudo o que fosse verdade agora fora verdade desde sempre, a vida toda. Muito simples. O indivíduo só precisava obter uma série interminável de vitórias sobre a própria memória. "Controle da realidade", era a designação adotada. (p. 47)
Você não vê que a verdadeira finalidade da Novafala é estreitar o âmbito do pensamento? No fim teremos tornado o pensamento-crime literalmente impossível, já que não haverá palavras para expressá-lo. (p. 68 e 69)
Os capitalistas eram donos de tudo o que havia no mundo e todos os outros homens eram escravos. (p. 92)
Ocorreu-lhe que em momentos de crise o embate da pessoa nunca era com um inimigo externo, mas sempre com seu próprio corpo. (p. 124)
 A visão das palavras amo você fizera transbordar nele o desejo de continuar vivo, e a idéia de correr riscos menores pareceu-lhe de repente uma burrice. (p. 133)
Talvez sob a superfície o Partido estivesse podre, talvez seu culto ao zelo e à abnegação não passasse de um biombo ocultando o mais completo desregramento. (p. 152)
Havia uma conexão íntima e direta entre castidade e ortodoxia política. Porque, de que maneira manter no diapasão certo o medo, o ódio e a credulidade imbecil que o Partido necessitava encontrar em seus membros se algum instinto poderoso não fosse represado e depois usado como força motriz? A pulsão sexual era perigosa para o Partido, e o Partido a utilizava em interesse próprio. (p. 161)
Quando você ama alguém, ama essa pessoa e mesmo não tendo mais nada a oferecer, continua oferecendo-lhe o seu amor. (p. 197)
Porque se lazer e segurança fossem desfrutados por todos igualmente, a grande massa de seres humanos que costuma ser embrutecida pela pobreza se alfabetizaria e aprenderia a pensar por si; e depois que isso acontecesse, mais cedo ou mais tarde essa massa se daria conta de que a minoria privilegiada não tinha função nenhuma e acabaria com ela. (p.226)
Na verdade, as três filosofias não têm quase nenhuma diferença entre si, e os sistemas sociais que elas justificam são idênticos. Em toda parte existe a mesma estrutura piramidal, a mesma adoração a um líder semidivino, a mesma economia justificada única e exclusivamente por uma atividade contínua de guerra. (p. 233)
A guerra devora o excedente de bens e contribui para preservar a atmosfera mental que convém a uma sociedade hierárquica. (p. 235)
Todas as novas teorias políticas, seja lá como se autodenominassem, reeditavam as idéias de hierarquia e regimentação. (p. 241)
Não estamos preocupados com aqueles crimes idiotas que você cometeu. O Partido não se interessa pelo ato em si: é só o pensamento que nos preocupa. Não nos limitamos a destruir nossos inimigos; nós os transformamos. (p.297)
A Novafala foi concebida não para ampliar, e sim restringir os limites do pensamento, e a redução a um mínimo do estoque de palavras disponíveis era uma maneira indireta de atingir esse propósito. (p.349)

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